segunda-feira, 5 de abril de 2021

Transição

Transição.
Uma palavra nova para aceitar o natural. Do couro cabeludo ao dedão do pé, da mente ao sentimento, tudo entra em transição para voltar ao que era antes do modelo ideal.
Depois dos 28 anos eu passei por várias delas sem ao menos me dar conta do que estava acontecendo. A gente começa a se livrar de um padrão e depois das coisas que vem com ele.
Primeiro foram os cabelos longos. A primeira vez cortei com medo, mas aí a gente vê que diferente da primeira vez -no sexo- com os cabelos você sente de verdade que mudou algo.
Depois disso descobri que relacionamentos, qualquer que seja, nada mais são que conversa, conversa e mais conversa. Não existe amor que perdure sem diálogo. E que é possível, EXTREMAMENTE POSSÍVEL, ser feliz sozinho. Atentem, eu disse sozinho e não isolado.
Descobri que você pode viver 100 anos com alguém e não saber quem é aquela pessoa, mas que também não precisamos de uma década inteira para se unir a alguém.
Deixe o cabelo crescer de novo. Me libertei do alisamento e dos fios alinhados. Curti ele grandão, armado, enrolado, descabelado, vermelho...
Tive um filho.
Cortei de novo, um pouco mais, um pouco menos e descobri que mesmo assim não precisa estar liso e alinhado.
Entendi, a duras penas e tarde pra caramba, que não consigo brigar com a gravidade e posso usar um top sem alça e blusas de alças finas com os meus peitos onde estão mesmo, longe do fim, mas bem distantes do começo. Se é difícil ser mãe depois de se ter um filho, ser mulher é uma batalha diária com um alto nível de derrota, mas a gente ganha também, nas duas plataformas.
E recentemente resolvi fazer o que tenho tentado desde a gravidez. Deixar de lado uma briga que comprei aos 17 anos: Acabar com os cabelos brancos. Uma batalha que já começa perdida, afinal eles só aumentam. Tinjo meus cabelos regularmente desde muito cedo. Aos 23 anos eu já tinha os cabelos totalmente grisalhos, hoje, aos 40, boa parte já consiste em mechas totalmente brancas.
Quando engravidei arrumei a desculpa perfeita, foram quase 9 meses sem tinta, mas às vésperas do parto ouvi: Antônio vai nascer, olhar e achar que é a Avó dele. Acreditei naquilo, achei super plausível: "Poxa é verdade, parece descuido. Não quero ser a mãe desleixada na porta da sala de cirurgia" .
Ahhhhh se eu tivesse uma bola de cristal.
De lá pra cá todos as vezes que deixei um raiz aparente ouvi muito isso entre outras atrocidades de gente que não te conhece, mas acha que a opinião dela é ouro em pó. Mal sabem essas pessoas que jogado ao vento tem o mesmo valor que purpurina, porém tem também o mesmo efeito. Gruda na gente, incomoda e só sai depois de muito esforço. As pessoas dão sua opinião vestida de conselho sem pensar no que aquilo tá te provocando. 
Bem, passa tempo, voa tempo e veio a pandemia.
Pouco mais de 1 mês fui comprar a tinta e não encontrei no mercado. Não vou ao centro da cidade, estamos tentando nos preservar ao máximo. Acabei deixando pra lá. E há duas semanas, depois do meu celular ouvir eu falar em cabelos brancos, começou a aparecer pra mim uma ENORME rede de apoio que atua nessa aceitação do grisalho. Eu que há estava empenhada em assumir, encontrei gente muito mais nova que eu não mesma situação. Gente bonita, leve, solta e de bem com a vida.
Vamos tentar. Pela 3a vez. 
Hoje, 5 de Abril de 2021, são 75 dias sem tintura e contando.